terça-feira, 31 de março de 2009

Miscelânea ou Da Arte de Fazer Visitas

Coltrane cujo apelido é Buda, fissuras nas estrelas pingam o leite dos deuses & você nunca foi a Paramarimbo, líamos Coxas contra Coxas, evoluções na melodia, varanda dos abraços enquanto as flores me inclinam a narrativa, com peito diurno é que cruzas doçura & soluços, ali onde a aventura perdeu os cascos, refratário sangue, que mordaça nos cinge o primeiro impulso na vidraça do instinto? meu tempo sem tempo de mulher-trovador - cada lâmina arrisca um olhar, bem sabes, perdoa-me ou navego na pedra, em madrugada/ de coisas não havidas.

Soberba de la Flor, arrependida de repentino adultério, 76 (?)

Antropometria do Período Azul, mas pode me chamar de Sharlenne

Digo Amor como quem traz/ a alma cheia de dedos,/ beija o pão secreto das origens/ ou vota no PSTU pela primeira vez/(é preciso abrir com paciência a rosa para sugar o dia)/ um oceano para cintura/ é raro mas tem vezes que me sinto/ Malucão cordame de cosmogonias/ afluentes, acidentes, visitas/ sorriso de dissolver arquipélagos ou a Enxurrada me vem sem pássaros de seda/ e em cada outubro sei/ que não vou chegar a dezembro/ ânus outonal/ "começa o tempo onde começa a mulher" entretanto/ & lembro que minha saliva sempre/ te foi sincera.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Intermezzo

"A realidade é contraponto: Picarianismo.
Surrealismo pós-cristão & caos esplêndido
emergindo sintaxe o que antes da vida foi
sono das espécies
Kistch barroco circo estantâneo Carnaval da Síncope
diários sexuais da primeira infância com todo o seu poder
de canção e passarinho.
Porque depuramo-nos
nos cristais do mito: Picarianismo."

GOLDMANN, Chico: "A Morfologia da Macaxeira: Notas sobre O Segundo Manifesto Picariano" In: Alberto Cigano - Literatura Comentada. São Paulo: Abril Cultural, 1987.

segunda-feira, 23 de março de 2009

TIRE O SEU SORRISO

TIRE O SEU SORRISO do caminho que eu quero passar, disse eu, querendo ao mesmo tempo falar tudo e nada, tateando lentamente no corredor das palavras obscuras, procurando nos seus olhos aquela dúvida que acompanha as interpretações incertas. Mas você na real apenas sorriu com sarcasmo, pois já sabia muito bem como é que as coisas se passavam deste lado: aleatórias. Influxo de inconsciência, me lembrei da técnica sem saber ao certo a qual dono pertencia, e você sabia exatamente que era assim que eu agia quando tentava explicar os motivos complexos que me levavam a detestar o seu maniqueísmo de espírito instintivo. Tudo na sua vida eram rolas e bocetas e ainda me vinha irônica dizendo que tinha respaldo científico assim como eu naquele velho judeu barbudo boqueteiro de charutos, e quando eu irritado falava o nome dele é Freu você cortava com um é, é foda, boa idéia, e me puxava me deixando puto da vida e duro como uma alma militar. Assim nunca saíamos dos seus domínios e era como ser um Prometeu com o fígado devorado todos os dias por um corvo sedutor que sabia morder do jeito certo nos lugares certos, cantando tristeza não tem fim felicidade sim e é por isso que nunca se deve esperar no deserto dos tártaros por uma qualquer coisa que te leve pra um teatro e ver uma peça do Brecht que te mostre a outra e/ou verdadeira realidade. Tire seu sorriso, mas você o mantinha simplesmente pra provar que eu estava errado em quase tudo no que eu insistia em especular e ler e interpretar, metafisicamente, dialeticamente, estruturalmente, psicanaliticamente, hermeneuticamente, fenomenologicamente, politicamente, socioeconomicamente, e todas as correntes do pensamento ocidental com as quais eu havia me deparado há um ou dois livros atrás, me irritando e me fazendo inquirir com violência quem você pensa que é pra me falar essas coisas ao que você me respondia sou tua louca tua escrava tua deusa tua guia e às vezes teu macho quando você começa com essa choraminguice schopenhaueriana e merece um vá-dar-meia-hora-de-cu, e eu sabia que nessa sua cabecinha maléfica você queria que eu fosse de verdade. Mas eu me vingava, ah eu me vingava, quando eu dizia enquanto você puxava aquele beck escroto que Arrigo Barnabé era melhor que Pink Floyd e Beatles juntos numa jam sesion nos anos 60 lotados de LSD só porque o campo harmônico que eles construía se estendia muito mais do que e você gritava calaaboca que eu quero viajar aqui quietinha na paz, e por dentro eu me ria e me chorava por saber que eu a havia tirado realmente do sério, tudo isso pra poder ficar só um pouquinho por cima que você não deixava nunca, nunca. Influxo de inconsciência, de quem era mesmo, meu deus, você rindo na minha cara, eu tentando achar um ponto nessa cena toda, algo que valesse alguma coisa em algum lugar, mas eu sabia, era verdade que eu sabia, que você sabia qual era o sentido de toda aquela cena e de todas as outras cenas do passado e do futuro, que era igual a chafurdar na lama do esgoto, era igual a tiro de 12 no peito, era igual a beber de fonte infindável, era igual a brilho de estrela, era igual a toda essa baixaria, era igual, era Amor.

Pedro Gabriel Ferreira
Garanhuns, março de 89

quarta-feira, 18 de março de 2009

The world don't give a shit mas eu canto

Golfo de espelhos & escrotos guaiamuns/ seda de bruços no chão da perdida inocência contudo/ não pasto nos grandes prados do visível - minha defensiva caligrafia suspeita que tempo nenhum será
jamais inoceânico.
"Estou vivo e escrevo sol."
Meninas banham as pernas/ no lago humilde de minhas palavras & insisto
que não me procures nunca os pés do oráculo.

quinta-feira, 12 de março de 2009

A Origem da Tragédia

Alberto Cigano constelada vagina
para o Nada
(todas as tardes cabem numa tarde se adivinhas
o secreto óvulo das primaveras)
Cigano, harpa de sombras
ensina-me um pecado original nessa tua pedagogia suave
de adolescências depiladas dividindo
o dorso das horas
Te testo, Cigano, com meus seis instrumentos &
esqueço
um brinco no banco do teu carro
Cigano, mi soledad florece.
ah, beber tua boca na minha taça
de gardênias, Cigano, deus-cadela
- manhosa que só ela.

Soberba de la Flor, num espelho de banheiro, outono de 1979.

domingo, 8 de março de 2009

A MACAXEIRA SEMIÓTICA

Diga-me:
Quantas batidas do teu coração faz que você não fode?
Uísque escorrendo por trás do teu cabelo úmido
Bitucas & Sofá & A Janela Do Teu Apartamento Mau Iluminado
Tudo isso, tudo isso, é Iluminação, meu amigo.

Eia!
Eia as ressacas matinais e o cheiro acre dos vômitos companheiros manchando aquele teu lençol de seda importada de mil e quinhentos paus!
Eia as berrações e os sussurros estupidamente geniais das bocas sacroprofanas que afloram naquela mesinha escondida no canto esquerdo do Savoy!
Eia as historias de foda regadas a vodka & gargalhadas & declarações de amor patéticas!
Eia Teu Apartamento Mau Iluminado Feijó pagando um boquete em Negão enquanto tu bêbo lascado morrias de ciúmes de ambos!
Eia um volume da Obra Completa do frango do Álvaro de Campos enfiado no cu dos acadêmicos delirantes!
Eia as folhas picarianas ovo direito da literatura moderna!
Eita toda a loucura Eia toda vanguarda Eia toda pornografia Eia!
Eia ... A MACAXEIRA SEMIÓTICA!

Chico,
Destruístes poemas desde sempre
Tua língua corrompeu tantas virgindades
Tua genialidade estampada no teu peito
As métricas da sabedoria destruídas pela tua imagética
A tristeza condenando a vontade
Chico,
Minhas idéias sempre foram parcas e nobres
Pedro e Dedé sempre me olharam com respeito
Você sempre com escárnio
Desafiando meu picarianismo
Chico,
Aquela carta que você enfiou no cu
Um dia há de retornar
Como um dia voltarão toda a sintaxe a métrica
A rima e a melodia
A vergonha e a condenação
E essa nossa luta terá ruído como ruíram todos os grandes
Chico...
Esse mundo é uma merda.

A Macaxeira Semiótica:
Vitória da loucura,
Escárnio do sublime,
Exercício de inteligência & criatividade,
(Maca xeira
Semi ótica)
Cultura fálica,
Representação simbólica,
Freud & Chaplin,
Vanguarda nonsense,
Estilização,
Picarianismo, Putaria ou Merdificação?:
A MACAXEIRA SEMIÓTICA