terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Tomates

Tomates meteóricos balançando sobre o chão. Tomates hipnóticos, vermelhos, vivos, sanguinolentos. Num mundo marrom e cinza, o rubro rebola de um lado para o outro, flutuando incólume pelas desgraças, como se nada no mundo lhe coubesse que não fosse rebolar. Eles, tomates, no ar agora o que antes eram do chão, da terra, filhos da terra, como nós, humanos. Ambos pó, ambos sangue, ambos alimentos, ambos virtualizações da podridão. Da terra eles foram arrancados, das terras arrancadas de quem não tem terras. Tomates, são frutos, são comida, são fome pra quase muitos, são comida pra poucos, alguns que nem os comem. Tomates vermelhos, quase sinto seu cheiro a me atrair a mente. Não tenho fome, mas os desejo, mas os consumo, mas os quero na minha cabeça, me dizendo mais do que somos tomates. Somos todos tomates. Flutuando estranhos, perdidos, chamando, mordidos, morrendo a cada instante que somos e não somos devorados.

Em volta dos tomates uma sacola. Na ponta da sacola, uma mão. Continuado da mão, um braço. Colado ao braço, um corpo. Um corpo que anda. Um corpo feminino.

Porra, e eu aqui pensando na merda dos tomates.

P. G. Ferreira. Extraído do livro Diálogos melancólicos de um casto voyeur, 1989.

sábado, 14 de novembro de 2009

Do triste fim de Alberto Cigano ou Ripples never come back

"Se Deus existe, Ele o abençoou com O Sexo, na literatura e no pau."
- Margareth Feijó, sobre suposto caso com Cigano, 1970.

"Cigano, anjo de dúvida, amargura do meu triste trópico."
- Dedé Schinneider, Ilha da Punheta: sobre a poesia do 1º Cigano, São Paulo: Ática, 1986.

"Uma vez, após uma noitada nórdica, eu perguntei quem ia pagar a conta, e ele respondeu: 'Tua mãe Pedro, que ela tá me devendo da vez que eu comi aquela vaca velha!'. Ele era assim, um tremendo filho da puta."
- Pedro Noiado, discurso no velório de Cigano.

"O cara é muito foda."
- Antonio Candido, nota escrita à mão em um exemplar de Seulement Picarianismo, 1984.

"Cigano, mi soledad florece.
ah, beber tua boca na minha taça
de gardênias, Cigano, deus-cadela
- manhosa que só ela."
- Soberba de la Flor, A Origem da Tragédia, 1979.

"Ele veio me perguntar se eu já tinha lido The Anxiety of Influence, e eu o mandei à merda."
- Heitor de Albuquerque, entrevista à Veja, 1991.

"Veja Cigano, por exemplo: nele encontramos aquilo que há de mais picariano, essa morbidez crítica de se saber eternamente latinoamericano."
Chico Goldmann, O Picarianismo como vontade & como representação, 1990.

"Conheci Alberto como se conhece os maiores mestres: vendo filme de putaria."
- Pedro Gabriel Ferreira, comentando a videografia pornô dirigida por Cigano, 1997.

"Quem tira onda é eu."
- Alberto Cigano, Mulheres de minha vida, 1965.

domingo, 8 de novembro de 2009

Luto

É com grande pesar que informo que morreu ontem, aos 64 anos, o poeta Alberto Cigano.

O corpo foi encontrado jogado na sala de seu apartamento em Itamaracá-PE, junto com uma garrafa vazia de Gim, 5 garrafões vazios de 5 litros de Carreteiro, 7 carteiras vazias de cigarro Hollywood verde e duas carreiras de cocaína não-cheiradas.

O poeta não mantinha mais contato com quase ninguém, além do seu velho amigo Pedro Noiado. Bastante triste, o amigo disse que Cigano andava muito decepcionado com o mundo: “Ele me ligava bêbado no meio da madrugada dizendo ‘Pedroca, finalmente caí na real, Lennon tava certo, Zappa tava certo, Heitor tava certo, porra, até Nietzsche tava certo, só aquele alemão barbudo feladaputa tava errado, caralho!’”.

Contudo, Noiado afirma que nos últimos dias Cigano aparentava estar um pouco mais animado, já que os dois estavam organizando um novo livro de poemas, já em fase de pré-publicação. “Era um projeto muito bom, como há muito tempo não víamos acontecer por aqui em Recife”, disse Noiado. Este afirma não saber se algo aconteceu para que Cigano tivesse entrado em depressão.

A causa da morte ainda não foi oficialmente confirmada, embora tudo leve a crer que se trata de uma overdose de vinho barato.

Junto com o corpo foi encontrado fragmentos do novo livro que estava escrevendo com Noiado e um roteiro já pronto de um filme pornô, provavelmente sua nova produção como diretor.

O Macaxeira Semiótica termina este triste post com o seu poema favorito de Cigano:

Autobiografia

Meu avô bordava rostos de Cristo em toalhas de mesa.

Minha avó bebia cachaça e ia jogar na roda de capoeira.

Dessa mistura improvável veio eu, tosco e mágico, feito chocalho de pajé.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Esta primavera não é

nenhuma Soberba que se cheire.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Premissas

.Oferta, a deslumbrante queimadura do sono

.Elevar o escatológico ao escatológico

.Nunca me chame pelo nome se não for
um nome de medo

.Casa Grande & Senzala

(Pós)Picarianismo ou Da eterna querela entre antigos & modernos

"Ter destino é não caber no caber no próprio berço."
Chico Goldmann, O Picarianismo como vontade & como representação. In: Tempo Picariano, n.16, 1990, p. 267-299.

"...lavemos o rosto no futuro, que o céu é sucessivo."
Soberba de La flor, O Primeiro Caderno de Poesia da Aluna Soberba.

"O problema todo é que ninguém me perguntou que ramo das devassidões eu prefiro...[risos]"
Dedé Schineider, entrevista à Playboy, julho de 1989.

"Mas uma geração não tem tempo de sozinha queimar todas as gravatas."
Alberto Cigano, Epístolas Subcutâneas - A correspondência íntima de Alberto Cigano e Margareth Feijó (1962-1970).

"Fato é que jamais declino de amar o espaço machucado."
Heitor de Albuquerque, Mémoires.

“Aos epígonos não têm ficado mais que encarniçar-se em demolir o que já está em ruínas. Eu quero ver é cosmogonia.”
Anônimo, Manifesto Picariano, 2ª edição revista e ampliada.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

OLHOS MAREJADOS JÁ NÃO CHORAM MAIS LÁGRIMAS

Tristeza é beber cerveja quente sozinho numa noite chuvosa e fudida/Absorver o presente fenomenologicamente por medo de nostalgia/ Tristeza é só chutar o balde já chutado pelo pé alheio/e manchar de seu sangue o plástico limpo/ Tristeza é aquela mancha velha de vômito no carpete conseqüência de outra Tristeza/ É uma mulher que te chupa mas nunca te faz gozar/ Tristeza é imaginar que lésbicas discutem semiótica/ É um poema inútil nascido de uma aula de literatura latina/ É aquela música lenta que te faz lembrar as flores que nuca recebeu/ Tristeza é o amor que se reconhece como tal/ Tristeza é a dicotomia da Tristeza/ É chorar pelo par de chifres que nunca se levou/(a Tristeza de Otelo e Bentinho)/ Tristeza é a forma mais ridícula de masturbação/ É a matéria mais clichê da poesia/É a arte mais clichê do ser humano/ Tristeza é a Tristeza do clichê/ Ou o clichê da Tristeza.

Heitor de Albuquerque,
Recife, 25/11/88

segunda-feira, 11 de maio de 2009

GRANDES FILMES PICARIANOS 1

Meu pau parecia maior quando eu era do PT.

Produção: Brasil/Vaticano
Ano: 1968
Idioma: Português
Legendas: Mandarin, Croato, Persa e Português.
Gênero: Drama/ Mainstream.
Direção: Alberto Cigano
Elenco: Renato Aragão, Kid Vinil, Antônio Cândido, Maitê Proença e Juscelino Kubitschek.
Duração: 253 min.

Sinopse: o filme conta a história de Jubileu, menino pobre que sai do interior sergipano para morar em São Paulo. Sem dinheiro, acaba parando em um beco da Augusta, onde se envolve com travestis, e logo aprende a arte do transformismo. Após ouvir um discurso de Fidel traduzido pelo Chacrinha, resolve entrar no movimento operário do ABC, e em pouco tempo se torna um dos cabeças do Partido dos Trabalhadores. Quando organiza uma greve de proporções gigantescas, é apanhado pela polícia e sofre torturas nas mãos dos milicas. É durante o cárcere que tem uma visão da Virgem Maria dizendo que ele deve espalhar o amor pelo mundo, e então, depois de conseguir um habeas corpus e sair da prisão, junta-se a uma trupe de hare krishnas saltimbancos e começa a percorrer o mundo cantando músicas dos Beatles e fazendo propaganda comunista. Um filme que fala sobre sexualidade, política, desespero e humanismo. Indispensável a qualquer homossexual, marxista, músico e cafetão.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Soneto da Punheta Neo Expressionista

Balaio vem , balaio vai
Acho que vim mesmo
do saco do meu pai

Balaio vem, balaio vai
quem é pederasta com convicção
dá o cu ouvindo Steve Vai

Balaio vem, balaio vai,
balaio vem e sacode minhas bolas
contra o vento da Europa Bizantina
me contempla o passado tenebroso
quando eu sonhava em ser enrabado
pelo Bozo.

Balaio fica, Balaio foi
Minha pica é mais saborosa
que carne de boi

Balaio volta, balaio fica
Quem não gostou
que vá comer banana nanica

Balaio vem , volta e faz 69
Quem não gosta de jasmin
devia raspar os pelos da bunda
contemplando a alegria de viver
dizendo "Até segunda" ,
e lembrando em meter no rabo do
filho cisplatino.

De: Aureliano Neves
Extraído do Ensaio
"Futuro que alarga meu rego"
Editora : Mamilos siribrinos

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Pintei de azul meus sapatos

porque não podia de azul pintar a rua
& não conhece demora o mar ou os magos que montam todos os fios da atmosfera
minha nuca com hálito de rosa branca até
toda a violência das coisas existindo mais do que nós até você ver
que todo barco está fazendo água
como pela desobediência da sombra
minha janela sustenta as próprias nuvens
mesmo se amoleço os ritos nessa velocidade de mercúrio ou
genitália à mão livre & perco na influência do vocábulo
meu jeito cool de amanhecer.

Soberbíssima, falsas astrologías & salt peanuts.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

KY

Porque quando beijo o Oriente é com todos os dedos/ teu corpo de água em fuga/ nas fronteiras de topázio/ (por mim até onde o cavalo bate a vista)/ silêncio de não sei/ que lua de Saturno/ finitude como desafio à adolescência dos tigres/ em tudo a suspeita costura/ dessa nossa astúcia & desejo
de fundar novas mitologias com sexo de papel

então fui à praia
mas tudo acabou em sacanagem

vaga música n.2 se nos oprime qualquer luar imotivado/ minha saliva hard bop/
tem dias que habito vestido de terça-feira chuvosa
& sou bonita com o que Deus me deu & sonho em que areia te captura a sombra/
para vermos o mar nascer/ eu & tu maior que a paisagem.


Soberba de la Flor, com sangue nos olhos, meados de 70.

sábado, 4 de abril de 2009

Arte Poética ou A Dialética do Fazer Bonito

Morte baiana, mao divina, púrpura/ prisma de estrela, senda filosófica, quero/ teu licor mais amargo, tuas tão sonhadas cores/ âmago soturno, pós-humanitismo/ metapoesia, alma desconstruída, Derrida/ ilusório fetichismo, imposto sonegado, acúmulo/ vidas e mais vidas, ócio criativo, tenho/ tito tudo lento, visão teleguiada/ mas este perfume, animal alado, cheiro/ dedos mensageiros, órgaos salivando, fome/ desespero blue, corte impreciso, merda/ suma sem vergonhas, perca sem dejesos, fume/ todo nosso ópio, ciência, massa/ arte de verdade, genialidade, eu.

A. Cigano, numa noite malucona de 77

terça-feira, 31 de março de 2009

Miscelânea ou Da Arte de Fazer Visitas

Coltrane cujo apelido é Buda, fissuras nas estrelas pingam o leite dos deuses & você nunca foi a Paramarimbo, líamos Coxas contra Coxas, evoluções na melodia, varanda dos abraços enquanto as flores me inclinam a narrativa, com peito diurno é que cruzas doçura & soluços, ali onde a aventura perdeu os cascos, refratário sangue, que mordaça nos cinge o primeiro impulso na vidraça do instinto? meu tempo sem tempo de mulher-trovador - cada lâmina arrisca um olhar, bem sabes, perdoa-me ou navego na pedra, em madrugada/ de coisas não havidas.

Soberba de la Flor, arrependida de repentino adultério, 76 (?)

Antropometria do Período Azul, mas pode me chamar de Sharlenne

Digo Amor como quem traz/ a alma cheia de dedos,/ beija o pão secreto das origens/ ou vota no PSTU pela primeira vez/(é preciso abrir com paciência a rosa para sugar o dia)/ um oceano para cintura/ é raro mas tem vezes que me sinto/ Malucão cordame de cosmogonias/ afluentes, acidentes, visitas/ sorriso de dissolver arquipélagos ou a Enxurrada me vem sem pássaros de seda/ e em cada outubro sei/ que não vou chegar a dezembro/ ânus outonal/ "começa o tempo onde começa a mulher" entretanto/ & lembro que minha saliva sempre/ te foi sincera.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Intermezzo

"A realidade é contraponto: Picarianismo.
Surrealismo pós-cristão & caos esplêndido
emergindo sintaxe o que antes da vida foi
sono das espécies
Kistch barroco circo estantâneo Carnaval da Síncope
diários sexuais da primeira infância com todo o seu poder
de canção e passarinho.
Porque depuramo-nos
nos cristais do mito: Picarianismo."

GOLDMANN, Chico: "A Morfologia da Macaxeira: Notas sobre O Segundo Manifesto Picariano" In: Alberto Cigano - Literatura Comentada. São Paulo: Abril Cultural, 1987.

segunda-feira, 23 de março de 2009

TIRE O SEU SORRISO

TIRE O SEU SORRISO do caminho que eu quero passar, disse eu, querendo ao mesmo tempo falar tudo e nada, tateando lentamente no corredor das palavras obscuras, procurando nos seus olhos aquela dúvida que acompanha as interpretações incertas. Mas você na real apenas sorriu com sarcasmo, pois já sabia muito bem como é que as coisas se passavam deste lado: aleatórias. Influxo de inconsciência, me lembrei da técnica sem saber ao certo a qual dono pertencia, e você sabia exatamente que era assim que eu agia quando tentava explicar os motivos complexos que me levavam a detestar o seu maniqueísmo de espírito instintivo. Tudo na sua vida eram rolas e bocetas e ainda me vinha irônica dizendo que tinha respaldo científico assim como eu naquele velho judeu barbudo boqueteiro de charutos, e quando eu irritado falava o nome dele é Freu você cortava com um é, é foda, boa idéia, e me puxava me deixando puto da vida e duro como uma alma militar. Assim nunca saíamos dos seus domínios e era como ser um Prometeu com o fígado devorado todos os dias por um corvo sedutor que sabia morder do jeito certo nos lugares certos, cantando tristeza não tem fim felicidade sim e é por isso que nunca se deve esperar no deserto dos tártaros por uma qualquer coisa que te leve pra um teatro e ver uma peça do Brecht que te mostre a outra e/ou verdadeira realidade. Tire seu sorriso, mas você o mantinha simplesmente pra provar que eu estava errado em quase tudo no que eu insistia em especular e ler e interpretar, metafisicamente, dialeticamente, estruturalmente, psicanaliticamente, hermeneuticamente, fenomenologicamente, politicamente, socioeconomicamente, e todas as correntes do pensamento ocidental com as quais eu havia me deparado há um ou dois livros atrás, me irritando e me fazendo inquirir com violência quem você pensa que é pra me falar essas coisas ao que você me respondia sou tua louca tua escrava tua deusa tua guia e às vezes teu macho quando você começa com essa choraminguice schopenhaueriana e merece um vá-dar-meia-hora-de-cu, e eu sabia que nessa sua cabecinha maléfica você queria que eu fosse de verdade. Mas eu me vingava, ah eu me vingava, quando eu dizia enquanto você puxava aquele beck escroto que Arrigo Barnabé era melhor que Pink Floyd e Beatles juntos numa jam sesion nos anos 60 lotados de LSD só porque o campo harmônico que eles construía se estendia muito mais do que e você gritava calaaboca que eu quero viajar aqui quietinha na paz, e por dentro eu me ria e me chorava por saber que eu a havia tirado realmente do sério, tudo isso pra poder ficar só um pouquinho por cima que você não deixava nunca, nunca. Influxo de inconsciência, de quem era mesmo, meu deus, você rindo na minha cara, eu tentando achar um ponto nessa cena toda, algo que valesse alguma coisa em algum lugar, mas eu sabia, era verdade que eu sabia, que você sabia qual era o sentido de toda aquela cena e de todas as outras cenas do passado e do futuro, que era igual a chafurdar na lama do esgoto, era igual a tiro de 12 no peito, era igual a beber de fonte infindável, era igual a brilho de estrela, era igual a toda essa baixaria, era igual, era Amor.

Pedro Gabriel Ferreira
Garanhuns, março de 89

quarta-feira, 18 de março de 2009

The world don't give a shit mas eu canto

Golfo de espelhos & escrotos guaiamuns/ seda de bruços no chão da perdida inocência contudo/ não pasto nos grandes prados do visível - minha defensiva caligrafia suspeita que tempo nenhum será
jamais inoceânico.
"Estou vivo e escrevo sol."
Meninas banham as pernas/ no lago humilde de minhas palavras & insisto
que não me procures nunca os pés do oráculo.

quinta-feira, 12 de março de 2009

A Origem da Tragédia

Alberto Cigano constelada vagina
para o Nada
(todas as tardes cabem numa tarde se adivinhas
o secreto óvulo das primaveras)
Cigano, harpa de sombras
ensina-me um pecado original nessa tua pedagogia suave
de adolescências depiladas dividindo
o dorso das horas
Te testo, Cigano, com meus seis instrumentos &
esqueço
um brinco no banco do teu carro
Cigano, mi soledad florece.
ah, beber tua boca na minha taça
de gardênias, Cigano, deus-cadela
- manhosa que só ela.

Soberba de la Flor, num espelho de banheiro, outono de 1979.

domingo, 8 de março de 2009

A MACAXEIRA SEMIÓTICA

Diga-me:
Quantas batidas do teu coração faz que você não fode?
Uísque escorrendo por trás do teu cabelo úmido
Bitucas & Sofá & A Janela Do Teu Apartamento Mau Iluminado
Tudo isso, tudo isso, é Iluminação, meu amigo.

Eia!
Eia as ressacas matinais e o cheiro acre dos vômitos companheiros manchando aquele teu lençol de seda importada de mil e quinhentos paus!
Eia as berrações e os sussurros estupidamente geniais das bocas sacroprofanas que afloram naquela mesinha escondida no canto esquerdo do Savoy!
Eia as historias de foda regadas a vodka & gargalhadas & declarações de amor patéticas!
Eia Teu Apartamento Mau Iluminado Feijó pagando um boquete em Negão enquanto tu bêbo lascado morrias de ciúmes de ambos!
Eia um volume da Obra Completa do frango do Álvaro de Campos enfiado no cu dos acadêmicos delirantes!
Eia as folhas picarianas ovo direito da literatura moderna!
Eita toda a loucura Eia toda vanguarda Eia toda pornografia Eia!
Eia ... A MACAXEIRA SEMIÓTICA!

Chico,
Destruístes poemas desde sempre
Tua língua corrompeu tantas virgindades
Tua genialidade estampada no teu peito
As métricas da sabedoria destruídas pela tua imagética
A tristeza condenando a vontade
Chico,
Minhas idéias sempre foram parcas e nobres
Pedro e Dedé sempre me olharam com respeito
Você sempre com escárnio
Desafiando meu picarianismo
Chico,
Aquela carta que você enfiou no cu
Um dia há de retornar
Como um dia voltarão toda a sintaxe a métrica
A rima e a melodia
A vergonha e a condenação
E essa nossa luta terá ruído como ruíram todos os grandes
Chico...
Esse mundo é uma merda.

A Macaxeira Semiótica:
Vitória da loucura,
Escárnio do sublime,
Exercício de inteligência & criatividade,
(Maca xeira
Semi ótica)
Cultura fálica,
Representação simbólica,
Freud & Chaplin,
Vanguarda nonsense,
Estilização,
Picarianismo, Putaria ou Merdificação?:
A MACAXEIRA SEMIÓTICA

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

EU VESTIA NELA A MINHA CAMISA FAVORITA

Choviam margaridas nos dias quentes, o sol tostando a melancolia com lambidas laranjas. Às vezes escutávamos os mandarins fornicando violentamente enquanto brigávamos pelo companheirismo de Rimbaud – o a sempre teve cor branca, dizia eu, aquele cigarro semiapagado pendulando-se em lábios ébrios. Ela me olhava sem olhos e eu me arrepiava quando pensava no que ela seria capaz de fazer com uma boca. Sem razão nenhuma a nuvem negra que pairava sobre a banalidade se escondia em nosso quarto, e eu me via tocando Chopin num tecladinho de bambu: bambo, sambo, lambo. É assim que se chega a um orgasmo, dizia eu com as mãos atadas de culpa – era sempre ligeiro demais. Mas as coisas mudavam mesmo quando eu defendia aquela tese de que Oswald era picariano simsenhor e que o pré era apenas um prefixo que os ignorantes colocavam na cabeça dos apressadinhos: como eu. Deixa eu chorar, reclamava, quebrei a porcelana chinesa de mamãe, e não adianta de nada eu escutar aquele disco do Cid Moreira narrando a Obra Completa de Freud; isso também é literatura. E enquanto as pétalas decoravam nosso carpete com seu realidade mal-disfarçada eu argumentava que hermenêutica era quando se fumava uma baseado e finalmente se conseguia entender o movimento estranho que fazem os contrabaixistas conduzindo um bebop verdadeiramente negão. Mas ela, do alto de sua superioridade plática, se negava a responder, pois como dizia Saussure, manequins costumam ser teimosos no que se refere a parole.

Pedro Gabriel Ferreira
Garanhuns, janeiro de 89

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

A SOCIEDADE ESCARLATE

José é Nietzsche se fodendo ciclicamente/ A aurora boreal de um céu de mandacaru/ vestindo rosas violetas por debaixo do te jardim mais pubiano/ José cria galinhas esperando enrabá-las em uma casinha de sapé/ as nádegas vítreas pedindo misericórdia/ Antes de tudo existia aquele desejo de perpetuar-se na cara de outro alguém/ No nome, depois/ Sociedade sangrada pelos dentes virginais do Zé/ Magia catimbó vendendo perfume para curar tuas cólicas renais/ Um poema gozado manchando as paredes de green tea at five o´clock/ Deus depende da dor de cada um, brasileiro/ José, dai-me a paciência necessária para encarar tamanho pragmatismo/ Que se rende a cada filosofia de banheiro/ quando estás chorando/ a dor que nunca chegaste a conhecer.

Heitor de Albuquerque

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Finalmente (A VIRGINDADE ARRANCADA AOS CHUPÕES)

Finalmente alguém tem a decencia intelectual de começar uma publicação online dedicada a maior iniciativa poéticasocialepistemolócigaestética já feita abaixo dos trópicos. Nada melhor para se entedner o picarianismo do que com um poema picariano:

A VIRGINDADE ARRANCADA AOS CHUPÕES

Tortura-me um desejo: acender tua vela/ os olhos furados pela beleza que é a discórdia/ toda essa baixaria que é apaixonar-se/ são cicatrizes, teus pelos pubianos/ queria o sopro da vida de Deus a excitar Adão/ calar teus verbos com humilhação/ Tudo isso, amor, é transferência/ (explica a psicanálise)/ Sou Edipiano, tu és minha Jocasta/ teu diário é o puto do meu pai/ Assim de longe isso parece pieguice/ Esqueceste tuas seringas debaixo dos meus lençóis/ manchados da nossa lama/ Aqueles dias parecem mais claros/ Você fodia quieta quando estava bêbada/ ou o silencio cortava a vergonha de quem não sabia nada/ Amaciaste as carnes da minha inocência/ com a violência dos vividos/ Da alma pequena brotou o fungo da paixão/ O Amor só te fode no rabo/ Se soubesses o quanto eu chorei terias se divertido mais/ Hoje em dia tenho ânsias quando lembro que acreditei naquela velha ideologia nascida das bocetas mau-comidas de princesinhas alvas/ Do romance à psicose:/ se pudesse ver-te novamente, ah!/ te sodomizava/ (vingança)/ Mas ainda assim gozaríamos/ juntos.

Heitor de Albuquerque